Corte Interamericana condena Brasil pela violação de direitos humanos de quilombolas no Maranhão

  • 13/03/2025
(Foto: Reprodução)
Documento reconhece que o Estado Brasileiro violou direitos de 171 comunidades quilombolas durante a implementação dos projetos da Base de Lançamento de Foguetes (CLA), na década de 80. Julgamento foi realizado em abril de 2023, mas a decisão só foi divulgada nesta terça-feira (13). Alcântara é o município brasileiro com maior número de comunidades quilombolas, segundo lideranças locais CONAQ O Brasil foi condenado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) por violar direitos humanos de 171 comunidades quilombolas que vivem em Alcântara, no Maranhão, durante a construção e implementação dos projetos da Base de Lançamento de Foguetes (CLA), na década de 1980. ✅ Clique aqui para seguir o novo canal do g1 Maranhão no WhatsApp O julgamento do caso foi realizado em abril de 2023, entretanto, a sentença foi divulgada nesta quinta-feira (13), pela corte que conta com membros da Costa Rica, Colômbia, México, Uruguai, Argentina e Chile. No documento, a corte concluiu que o Estado Brasileiro violou os seguintes direitos das comunidades quilombolas: Direitos à propriedade coletiva e circulação de residência; Descumpriu sua obrigação de delimitar, demarcar, titular e sanear o território quilombola; Não concedeu títulos individuais de propriedade em vez de reconhecer a propriedade coletiva; Descumpriu o seu dever de garantir o pleno uso e aproveitamento território, tais como o exercício das comunidades em sua atividade econômica e de alimentação; O Estado não cumpriu suas obrigações ao não realizar uma consulta prévia, informando as comunidades, sobre medidas que pudessem afetá-las com a implementação do CLA. De acordo com a corte, a falta de resposta judicial sobre as reinvindicações dos quilombolas gerou sentimentos de injustiça, impotência e insegurança, afetando a vida coletiva e impedindo acessos à saúde, educação e a meios de subsistência. Além disso, o reassentamento das comunidades para as agrovilas (conjuntos habitacionais construídos por conta da implementação do Centro de Lançamento de Alcântara), a partir de dezembro de 1998, prejudicaram o acesso aos recursos naturais por parte das comunidades tradicionais, causando impactos socioeconômicos. Centro de Lançamento de Alcântara, no Maranhão REUTERS Com a decisão, a corte ordenou que o Estado Brasileiro conclua as ações adequadas para garantir o direito à propriedade coletiva de todas as comunidades, com a oferta de um título coletivo que reconheça os 78.105 hectares do território quilombola com a delimitação adequada. O Estado também deve estabelecer um diálogo permanente de comum acordo com as comunidades realizando consultas prévias e, ainda, realizar um ato público de reconhecimento de responsabilidade internacional sobre o caso. Brasil reconheceu culpa Advogado-geral da União, Jorge Messias, durante julgamento do Brasil na Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH). Reprodução Quando o caso foi levado para julgamento na Corte Interamericana de Direitos Humanos, em abril de 2023, no Chile, o Brasil pediu desculpas aos quilombolas e reconheceu que o Estado violou os direitos à propriedade e proteção judicial das comunidades de Alcântara. A declaração foi dada pelo advogado-geral da União, ministro Jorge Messias. O ministro atribuiu ao fato do Brasil não ter finalizado o processo de demarcação do território quilombola de Alcântara e pela demora das instâncias judiciais e administrativas para permitir que as famílias pudessem fazer uso das terras demarcadas. "O Brasil gostaria de aproveitar para reconhecer formalmente, em caráter oficial, a violação dos direitos à propriedade e a proteção judicial. O processo [de reconhecimento das terras] tardou demais e até hoje não foi finalizado. Por isso, solicitamos que o tribunal reconheça a culpa", disse o ministro. Termo pretende dar fim a impasse Lula assina decreto que põe fim há 40 anos de conflitos entre quilombolas e Centro de Lançamento de Foguetes no MA Reprodução/Youtube Em novembro de 2024, em visita à Alcântara, o presidente Luís Inácio Lula da Silva (PT) assinou um Termo de Conciliação, Compromissos e Reconhecimentos Recíprocos que pretendeu dar fim a 40 anos de conflitos entre as comunidades quilombolas e a Força Aérea Brasileira (FAB). O documento reconheceu que o Território Quilombola de Alcântara conta com 78,1 mil hectares e delimita a área do Centro de Lançamento de Alcântara (CLA), com 12.600 hectares. Além disso, o Governo Federal, na época, se comprometeu a dar o título de propriedade da área aos quilombolas e, ao mesmo tempo, validou a área pertencente ao Programa Espacial Brasileiro (PEA), para evitar conflitos sobre a posse das terras no futuro. LEIA MAIS Cidade mais quilombola do Brasil, Alcântara (MA) aguarda demarcação e abriga base de foguetes; caso foi levado a tribunal internacional Quilombolas rompem tratativas com o governo Lula sobre plano de expansão do Centro de Lançamento de Alcântara Entenda o conflito Vista área do Aeroporto de Alcântara, localizado na área do Centro de Lançamento de Alcântara (CLA) Divulgação/Agência Espacial Brasileira Município com 22 mil habitantes, Alcântara fica numa península com localização privilegiada para o lançamento de foguetes e satélites. Próximo à linha do Equador, o centro - inaugurado pela Força Aérea Brasileira (FAB) em 1983 - possibilita uma economia de até 30% no combustível usado nos lançamentos. A construção da Base de Lançamento de Foguetes, na década de 80, levou um território de 52 mil hectares a ser declarado como de “utilidade pública”, segundo a CIDH, e as disputas territoriais duraram mais de 40 anos na região. O impasse levou o caso para ser julgado na Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) em abril de 2023. Na época, representantes das comunidades quilombolas e autoridades brasileiras participaram do julgamento que contou com fortes depoimentos dos afetados pela implementação do Centro de Lançamento de Alcântara (CLA). 'Medo de perder minha cidadania', diz quilombola que aponta direitos violados após construção do Centro de Lançamento de Alcântara Apesar dos avanços em tratativas sobre o caso, na época, representantes das comunidades quilombolas ainda não comemoraram o resultado. Danilo Serejo, cientista político e líder comunitário na Comunidade Quilombola de Canelatiua, disse que é preciso ter cautela nas comemorações imediatas, uma vez que em apenas um ano o governo deve efetivar a titulação do acordo. "A Portaria de Reconhecimento assinada hoje é um marco muito bom nisso, porque reforça a posse das comunidades, mas por si só também não oferece a segurança jurídica necessária, porque não possui força de título de propriedade. Quanto aos compromissos dos militares de não expandir a Base sobre o território das comunidades, é importante dizer que essa não é a primeira vez que eles assumem esse compromisso", disse o ativista ao g1. Segundo o quilombola, em 2008 foram firmados outros acordos judiciais que nunca foram cumpridos, o que o impede de "comemorar nada ainda".

FONTE: https://g1.globo.com/ma/maranhao/noticia/2025/03/13/corte-interamericana-de-direitos-humanos-condena-o-brasil-pela-violacao-de-direitos-humanos-de-quilombolas-no-maranhao.ghtml


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